Nise da Silveira (1905-1999): um pequeno histórico de uma grande mulher
Nascida em Maceió, em 15 de fevereiro de 1905, a psiquiatra Nise da Silveira foi a única mulher formada pela Faculdade de medicina da Bahia em 1926; escolheu a carreira de psiquiatra devido a um artigo jornalístico e uma visita a um presídio em Recife. Sua tese, “Ensaio da criminalidade da mulher no Brasil”, foi motivo de sua escolha na carreira.
Considerada “rebelde”, teve no Rio de Janeiro, várias incursões como psiquiatra e trabalhou em instituições, (Hospital da Praia Vermelha) opondo-se aos tratamentos tradicionais vigentes (lobotomia, eletrochoque, choque de cardiazol) por considerá-los cruéis e introduziu a criação de um setor de atividades.
Foi considerada comunista e chegou a ser presa em 1935 (Ditadura Vargas), ocasião em que conheceu Olga Benário e Graciliano Ramos. Posta em liberdade em 1937 e impedida de trabalhar por 8 anos, aproveitou para conhecer a obra de Freud.
Reiniciou seu trabalho no Hospital de Engenho de Dentro em 1944, ocasião em que introduziu os trabalhos manuais, a pintura e a escultura como meio de expressão do mundo interior e esse tratamento restituiu a seus enfermos o lugar e a dignidade de “pessoas”. O afeto e a convivência com os animais permitiu a convivência dos pacientes com cães e gatos, quebrando o isolamento provocado pelas frias paredes e corredores do hospital.
Sua sensibilidade permitiu que percebesse que as atividades expressivas como pintura, desenho e escultura, facilitavam o acesso ao inconsciente, permitindo a conexão entre os dois mundos, interno e externo. Segundo Nise, “o que não é posto em palavras é expresso nas imagens, o que facilita a compreensão e a comunicação”.
Precursora e incentivadora da inclusão social, aproximou os pacientes de suas famílias e assim, minimizou o sofrimento, facilitou a interação e possibilitou melhoras. Com a colaboração de artistas, amigos e voluntários criou, na década de 70 do século passado (XX), um centro comunitário, a “Casa das Palmeiras”, no bairro da Tijuca (RJ); pretendia transformar essa casa num Centro Diário e inclusivo, com a possibilidade de passar a noite, em substituição às internações hospitalares. Foi precursora dos atuais CAPSs (Centros de Atenção Psicossocial) implantados pelo SUS (Sistema Único de Saúde), devido ao processo da Reforma Psiquiátrica Brasileira e hoje ameaçados.
A quantidade de trabalhos desenvolvidos pelos frequentadores foi tamanha que criou-se em 1956 o “Museu de Imagens do Inconsciente”, com trabalhos de pacientes, sendo que muitos deles tiveram suas obras estudadas por Carl Jung, psiquiatra, discípulo de Freud na Suíça.
Hoje, anualmente há o prêmio “Arthur Bispo do Rosário”, concurso com a participação de obras de arte de doentes mentais e de usuários de CAPSs do Brasil inteiro.
Margarida Licursi Prates
Psicanalista e membro da Rede Inconsciente Real
Fontes:
*Livro : Luis Carlos Mello “Nise da Silveira – caminhos de uma psiquiatra rebelde” Automáica Ediçõies ltda, R. de Janeiro;
*Filme “Nise, o coração da Loucura” direção de Roberto Berliner, 2015.