Mulheres da Psicanálise: Lou Salomé

Ouse, ouse… ouse tudo! Não tenha necessidade de nada! Não tente adequar sua vida a modelos, nem queira você mesmo ser um modelo para ninguém. Acredite: a vida lhe dará poucos presentes. Se você quer uma vida, aprenda… a roubá-la! Ouse, ouse tudo! Seja na vida o que você é, aconteça o que acontecer. Não defenda nenhum princípio, mas algo de bem mais maravilhoso: algo que está em nós e que queima como o fogo da vida!
Lou Andreas-Salomé

 

Liolia von Salomé (nome de batismo), mais conhecida como Lou Andreas-Salomé (1861 – 1937) foi uma ensaísta, filósofa, poeta, romancista e psicanalista. De origem russo-alemã, nasceu em São Petersburgo e foi a filha caçula e única mulher de um uma família de seis irmãos (dos quais somente três sobreviveram). Seu pai era um general russo, descrito como uma figura afetuosa por quem Lou tinha grande admiração e o considerava como o “primeiro modelo de Deus”. Sua mãe era uma mulher religiosa, dedicada à família, mas independente. Salomé cresceu em um lar harmonioso e sempre foi muito protegida pelo pai e irmãos.

Apesar de ter Deus como uma figura marcante na infância, de personalidade livre foi se mostrando descrente aos dogmas religiosos, sobretudo da igreja evangélica frequentada pela família. Aos 17 anos conheceu o pregador holandês Hendrik Gillot, que tinha ideias religiosas inovadoras para a época e, após a morte de seu pai, o procurou para estudar teologia, filosofia, metafísica e literatura francesa e alemã. Estabelece uma relação paternal com o pastor, mas ao descobrir que ele preparou seu divórcio escondido para lhe pedir em casamento, decide se afastar.

Aos 19 anos deixou sua cidade natal em busca de novos conhecimentos e foi viver em outros países da Europa, em especial Alemanha. Entra para Universidade de Zurique na Suíça, umas das poucas escolas que aceitavam mulheres, dando início aos seus estudos em história da arte e teologia.

Aos 22 anos, com uma carta de recomendação em mãos, foi para Roma conhecer a escritora alemã, ativista e feminista Malwida von Maysenburg (1816-1903). Defensora da liberdade humana, Malwida abdicou de títulos de nobreza e dedicou a sua vida a ajudar mulheres a se emancipar.

A escritora, que simpatizou com Lou desde o primeiro momento, apresentou-lhe a Paul Rée e a Nietzsche. Com eles, formou um trio chamado “Santa Trindade”, na qual compartilharam durante algum tempo a casa, a vida pessoal e os estudos. Ambos a pedem em casamento, mas ela recusa em nome de sua liberdade. Nietzsche, passa então a fazer várias críticas e Rée o que deixou Lou incomodada. Diante de seu desencanto com o filósofo, decide romper com a Trindade e muda-se para Paris somente com o amigo Rée.

Alguns anos mais tarde, em 1886, Lou Salomé conhece o professor de línguas orientais Friedrich Carl Andréas e se casa com ele um ano depois, após uma ameaça de suicídio de Friedrich. Contudo, estabeleceu que não teriam relações sexuais, fazendo uma distinção entre casamento e amor sensual.

Em 1897, conheceu o poeta austríaco René Maria Rilke (1875- 1926), 14 anos mais novo e ainda desconhecido, com quem viveu um intenso romance por três anos. Mesmo depois de separados, mantiveram uma relação de amizade e se correspondiam por cartas.

Logo após o rompimento com Rilke, escreveu um ensaio sobre feminilidade e sentimento amoroso com título de “Reflexões sobre o problema do amor”, que mostra como a noção de feminilidade foi se constituindo dentro da psicanálise. 

Em 1911, participou do III Congresso de Weimar da Associação Psicanalítica Internacional, onde conheceu Freud. Sua aproximação com o criador da psicanálise se deu devido ao seu interesse pelas relações humanas, universo feminino e por temas como amor e erotismo. 

Discípula de Freud e chamada por este de “poetisa da psicanálise”, foi uma das primeiras mulheres a fazer parte do grupo de psicanalistas de Viena e tornou-se analista de Anna Freud.

Respeitada e admirada por intelectuais de sua época, Lou Salomé foi considerada uma mulher à frente de seu tempo. Quase uma lenda, tornou-se conhecida não apenas pela sua obra, mas também pelo seu modo ousado de levar a vida, sua presença sedutora e cativante que despertou grandes paixões masculinas.

Após seu falecimento (1937), seus livros e escritos foram confiscados pela Gestapo por considerar a psicanálise uma ciência judaica. Entretanto, Ernest Pfeiffer publicou quatro livros de Lou postumamente, incluindo sua autobiografia intitulada “Revendo minha vida”.

 

Aline Mossmann

Psicanalista, psicóloga com especialização em saúde da família pela UNIFESP, integrante da rede Inconsciente Real e do grupo de estudos “Feminismo e Psicanálise”.

 

Referências Bibliográficas:

ALVARES, Jurenice Picado. Vicissitudes no desenvolvimento da psicossexualidade em Lou Andréas-Salomé: a poetisa da psicanálise. Ide (São Paulo),  São Paulo ,  v. 40, n. 65, p. 207-221, jun.  2018. Disponível em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-31062018000100017&lng=pt&nrm=iso>. Acesso:  08  fev.  2021.

CALEGARI, Mari. Os Casos de Amor de Lou Andreas-Salomé. In Blog da Mari Calegari, 07/05/2020. Disponível em: <https://blogdamaricalegari.com.br/2020/05/07/quem-foi-lou-andreas-salome-conheca-sua-vida-e-seus-casos-de-amor/>. Acesso: 08  fev.  2021.

CANTINHO, Maria João. Lou Salomé: a mulher que encantou Nietzsche e Rilke. In Revista Caliban, 11/12/2016. Disponível em: <https://revistacaliban.net/lou-salom%C3%A9-a-mulher-que-encantou-nietzsche-e-rilke-83c4d938b792>. Acesso: 08  fev.  2021.

RODRIGUES, Natália. Lou Salomé. In Blog Eternamente Lou. Setembro de 2007. Disponível em: <http://eternamentelou.blogspot.com/> Acesso: 08  fev.  2021.

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