Filme “Doente de mim mesma”
No filme “Doente de Mim Mesma” (Sick of Myself), do diretor norueguês Kristoffer Borgli – disponível na plataforma Mubi – somos inundados por temas contemporâneos que ecoam os absurdos da era digital e do espetáculo da imagem. A protagonista, Signe, é uma jovem barista envolvida em delírios de grandeza numa constante busca por atenção – a começar pela do próprio namorado.
Signe tem uma obsessão sem limites por ser o centro das atenções. Para alcançar seu objetivo a personagem coloca sua própria vida em risco fazendo uso de um medicamento proibido para induzir lesões inexplicáveis na pele, o que a torna portadora de uma doença misteriosa e numa celebridade instantânea.
Signe se afunda cada vez mais numa narrativa onde uma boa vida se resumiria a “ser ou não ser” o centro das atenções. Nem mesmo a relação com o namorado Thomas (que é tão problemático quanto ela) é poupada desse ideal.
Paradoxalmente, quanto mais a doença ameaça sumir com sua vida, mais a faz aparecer na sociedade. A ironia do filme reside nesse lugar, na forma como Signe tenta preencher um vazio interior (que deveria ser tratado em análise) com a atenção externa, mas que acaba por consumi-la cada vez mais no processo.
A obra de Borgli escancara até que ponto podemos adoecer e mergulhar numa pobreza existencial quando tentamos preencher nosso vazio ao invés de criar algo autêntico a partir dele, o que culmina em efeitos desastrosos, como atitudes inconsequentes e absurdas que levam a auto destruição.
A sociedade contemporânea alimenta esse ciclo de busca incessante por fama, grandeza pessoal e corpos perfeitos, mas como cada um lida e se posiciona subjetivamente diante disso? A sátira inteligente de Borgli nos leva a questionar não apenas os limites éticos e morais dessa busca, mas também a explorar vulnerabilidade do Eu em um mundo marcado por esses ideais.
“Sick of Myself” nos lembra que podemos nos perder tão completamente em nossas neuroses que nossa própria busca se torna nossa ruína. O filme é uma meditação oportuna sobre os perigos da cultura do narcisismo e a obsessão pela validação externa, nos convidando a refletir sobre o que é uma vida interessante e que vale a pena ser vivida em meio ao frenesi das redes sociais e da busca pela notoriedade a qualquer custo.
Patrícia Andrade
Psicanalista e psicóloga, aprimorada em Saúde Mental pelo Instituto A Casa e membro da rede Inconsciente Real